quarta-feira, 16 de junho de 2010

Os problemas agem em bando

Fernando acidentou-se na rua da lanchonete em que faz seu lanche à tarde. O que sucedeu-se é que foi atropelado por um problema que dirigia uma caminhonete em alta velocidade (ocorreu que seu irmão foi abandonado pela mulher e queria morar um tempo em sua casa). O motorista desceu e ficou ali a seu lado. Logo juntou-se um pedestre curioso (seu chefe lhe deu um projeto urgente para finalizar no fim-de-semana). A partir daí foram se ajuntando a Fernando vários problemas, alguns novos, outros antigos e seus conhecidos de longa data. E ficavam a volta do acidentado, e este não conseguia fazer nada para impedir aquele aglomerado que cada vez mais o oprimia. Desde o acidente, Fernando ouvia vozes. No início soavam fortes, conselhos de amigos e familiares, uma “caída de ficha” ao ouvir “levanta, sacode a poeira e dá a volta por cima”, uma benção do padre e incontáveis apelos da mulher. Mas mais e mais problemas chegavam em volta do acidentado para ver o que havia acontecido, porque ali havia muita gente, deveria haver algo interessante (ah, os problemas, esses desocupados...) e quanto mais chegavam, mais sufocavam a Fernando e menos, e cada vez mais distante, ele conseguia ouvir as vozes que lhe diziam para sair dali. Passados seis meses (porque os problemas, ao contrário das pessoas, não precisam ir embora trabalhar, aquilo é o trabalho deles...), ele se levantou e foi se embrenhando na multidão que o cercava. Era uma selva intransponível, pensou, mas continuou caminhando. Por muito tempo caminhou e estava a desanimar, de tantas voltas que havia dado, até que, de repente, ao desvencilhar-se de um problema aterrador, viu-se saído da selva e debaixo de um céu ensolarado e brilhante. Parado ali, exausto, respirava profundamente e o admirava. Um velho que tudo havia visto, lhe disse: - foi por pouco rapaz, já vi bons homens e mulheres que, passado o tempo que para ti passou, não mais se levantaram do local do primeiro acidente e lá ficaram até que morreram sufocados; outros ainda, adentraram na selva, mas perderam-se e, ao minguar da 7ª lua, desistiram de procurar a saída e sentaram-se ao chão e deixaram-se devorar pela terra. Rapaz, deixe eu lhe dar um conselho de velho, das próximas vezes, sim haverão, vê se olha por onde anda...

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